quarta-feira, 31 de agosto de 2011

Com um grande Obrigado no fim

As calçadas falam breves e fugazes ao som dos meus passos apressados que fogem ao medo de ser assolados por outros passos. Caminho de cabeça longe, entre uma Primavera chegada e um Outono acabado. Há frio, há sol, e falta-me um casaco que me aconchegue os braços. Que me aconchegue a alma desta angústia fulminante que nasceu há muitos anos. Ou nem tantos. Mas o tempo é relativo e relativamente a mim, passou muito tempo, tempo demais, e quero perguntas a quem quero dar respostas, e desejo as respostas às minhas perguntas.
E continuo a andar, e aumenta o cantar da calçada e eu aumento o meu passo, já de si apertado. Mas rápido. É o caminhar de anos com a pressão desses mesmos anos em cima. Dobro a esquina e entro noutra rua que não conheço. Tanta coisa que desconheço e que queria conhecer. Olho o telemóvel que está em modo silêncio, tal como o Mundo em que vivo. Olho para trás Não vem ninguém. Preciso de alguém.
O barulho do comboio ao longe desperta-me. Onde estou? O que sou? Fecho os olhos e sinto o vento a bater na cara. E nos braços. Sinto tijolos debaixo da mão apoiada na parede e imagino-lhes a cor – um laranja torrado. Inebriada pela sensação de Liberdade, assusto-me ao perceber que o vento me levou o véu. E no Médio Oriente não se anda sem véu – muito menos anda sem véu uma fugitiva. Saltam-me lágrimas, e cai chuva – não, afinal sou só eu a chorar, com o véu no pescoço. Os passos continuam solidários e isso faz com que não precise de olhar para trás, isso faz-me lembrar o que deixei. Há o barulho das crianças, o tom autoritário do Iraniano meu marido e dono. Penso na revista deixada pela Europeia que trabalha na Grande empresa de Teerão.
Estava em Inglês. Agradeci a Alá o momento em que a minha mãe levou a sova do meu pai. Uma enorme consequência da exigência que ela fazia... Tirar um curso de Inglês. E o curso que tirou muita saúde à minha mãe, mas que me dá agora muita saúde. 
Ainda não sei como sair do País. Há organizações, sei que há. A revista confirmou o eu pensava poder ser possível. Mas onde? Não se pode confiar em ninguém. Carrego no meu corpo anos de submissão traduzidos em marcas que me identificam no corpo e na alma. Há um largo. Um círculo que me assusta. Não quero voltar ao mesmo...sigo pela transversal, fujo da praceta cúmplice do meu estado: acusações, culpas e desculpas... Acusações. 
Sigo solitária com os meus paços e com o vento. Tão só como quando tinha a casa cheia. 
E agora? Agora vou caminhar. Até me encontrar. Me encontrarem ou ser encontrada.
Poderei ir e voltar? Não... Sarar as mazelas para as tornar depois mais fortes é carregar água com sede e não a beber. 
Oiço passos. Serão ajuda ou destruição?


 128º lugar (de entre 819), Concurso Conte Connosco, Julho 2011

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